sábado, 14 de março de 2009

Português dual

Ser português tem muito que se lhe diga. Tanto vivemos as vitórias da selecção, empoleirados aos pés do leão do Marquês de Pombal, roucos de tantos vivas, como caímos na mais lúgubre depressão quando o chefe olhou de lado, a morenaça da caixa do supermercado nem sorriu a uma graçola nossa, o rolamento da roda traseira direita começou a zoar, o cheque dos reembolsos do IRS tarda a chegar. Já aqui comentei o orgulho de ser tuga ao ver o que os patrícios fizeram no Brasil: os fortes do Amazonas, lá na pata que os pôs, na fronteira com a Bolívia e a Colômbia, cidades como Ouro Preto, Diamantina, as exportações que enriquecem o PIB brasileiro, como o coco, e os seu derivados, a cana e o açucar, os bois vindos da Índia, enfim, tudo com marca bem lusitana, de primeiros grandes box-movers mundiais.

Também com marca bem lusitana, como o nome indica, o trabalho da cientista Elvira Fortunato, que “inventou” os leds transparentes e o transistor de papel, que são autênticas revoluções, não só científicas, tecnológicas, mas também, civilizacionais. E que bom que ela tenha encontrado na Universidade Nova de Lisboa, um parceiro que lhe põe à disposição, todos os meios de que ela necessita para as pesquisas que leva a cabo. Brilhantemente. Não sei se todos entendemos bem do que se trata, mas tem a ver com a indústria da comunicação, que é quem lidera o progresso tecnológico. À escala do planeta. Os leds transparentes vão tornar obsoletos todos os suportes de imagem conhecidos: écrans de tv, manómetros analógicos ou digitais, etc... Em vez de se produzirem monitores de canhão de electrões, monitores de plasma ou de quarzo líquido, a imagem poderá formar-se em qualquer vidro, manga de plástico e outros materiais de produção (ainda) barata. O transístor de papel é uma revolução mais admirável ainda, já que vai lançar para o caixote do lixo da história, uma data de tecnologia, ainda bastante cara: as memórias de computador, as “pendrives”, livros e jornais, já que permite “armazenar” um romance como Guerra e Paz, ou Os Irmãos Karamazov, sem falar do Visconde de Bragelonne, numa só folha de papel reciclado; um jornal diário pode ser igual a uma página da internet, com imagens fixas, e em movimento, e muito mais... Coitado do Gutemberg! Levou seis séculos a inventar a tipografia, e, cinco séculos depois, lá vai tudo para o esgoto! É realmente brilhante.


O que não é brilhante é que, em Portugal, NINGUÉM se interessou por tudo isto. A Ferrari já está a equipar os seus carros com os pára-brisas recheados de leds transparentes, para que o condutor não tenha de baixar os olhos para o painel dos instrumentos; mas nós não somos todos jogadores de futebol da primeira linha para usufruirmos destas benesses. Azar. E, pior do que isso, li, num jornal de hoje, que são brasileiros que vão investir no transistor de papel. Ora porra! Quem foi o filósofo que disse que, depois do amor, a carne é triste?


Mas logo a seguir, vi uma notícia de primeira página, noutro jornal, com foto dos pneus e tudo, que conta que o Sócrates engordou 8 quilos! Haja saúde! O ânimo do tuga é uma verdadeira montanha russa.